domingo, 30 de novembro de 2008

Morre lentamente...

Morre lentamente quem não viaja, quem não lê,
quem não ouve música,
quem não encontra graça em si mesmo.

Morre lentamente quem destrói o seu amor-próprio,
quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito,
repetindo todos os dias os mesmos trajetos,
quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor
ou não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru.

Morre lentamente quem evita uma paixão,
quem prefere o negro sobre o branco
e os pontos sobre os "is" em detrimento de um redemoinho de emoções
justamente as que resgatam o brilho dos olhos,
sorrisos dos bocejos, corações aos tropeços e sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz,
quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho,
quem não se permite pelo menos uma vez na vida fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da sua má sorte ou da chuva incessante.

Morre lentamente quem abandona um projeto antes de iniciá-lo,
não pergunta sobre um assunto que desconhece
ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.

Morre lentamente...

Pablo Neruda

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Atracção plo Mestre

Homenagem a Manoel d´Oliveira

Algazarra

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

8º Esq. Traseiras

A minha vizinha tem formas redondas e generosas. Se não fossem os braços e as pernas a atrapalhar, bem que podia rebolar.

De vez em quando lá me cruzo com a senhora no elevador. No outro dia trazia um fato de treino cinzento, felpudo , meio justo (não sei se a roupa é que era pequena, e então tem de ir às compras, ou já não há em lado nenhum loja com roupa que lhe sirva, e tem que usar a que tem, assim mesmo, colada!) ... enfim, disse-me que ia andar a pé.

...até à praia!
...não consegue ir a ginásios nem fazer dietas!
...10 minutinhos é melhor do que nada!
...e riu-se.

Despedimo-nos.
A minha vizinha foi com o passo arrastado à vidinha dela ... eu parei a minha por instantes.

" - Que esperta a senhora , hem?! Já que não consegue emagrecer o corpo que lhe pesa , vai emagrecer a consciência ... bom truque!!!"

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

São mesmo só dois dias!!!

Emília passou pla vida quase sem dar por isso... e a vida agora já não dá nada por ela!
Tem 90 anos.

Dá nomes e formas às memórias para conseguir sobreviver...
Vai fintando a tristeza das 9 às 5 num centro de dia perto de casa.
Quando chego está sentada numa cadeira tão velha como ela, encaixada no meio de outras tantas.
O centro é apertado e está cheio de gente. Cheira a sopa e a gás de cozinha que a merda do exaustor não ventila ... está frio lá dentro e há grades nas janelas... fico enjoada.

A velhinha quer falar ... eu deixo, claro!
Há saudade e solidão em cada palavra.
Pergunto-lhe o que fazia quando era nova:
"-Espalhei afectos... "
Por isso todos gostavam dela... já cá não estão para retribuir.

Arrepende-se de não ter tido filhos, diz, talvez agora o coração estivesse mais quentinho.
Conta também que embora só se tenha apaixonado uma única vez
entregou o coração a vários homens,
porque se pode amar de várias maneiras.

Emília encarquilhada e enrroscada sobre si mesma, ocupa pouco espaço... é quase bonita!
Dos tempos áureos resta-lhe o sorriso transparente e sincero e a grandeza daqueles que dão, sem pedir nada em troca.Fala com dificuldade porque o peso da idade a deixou sem fôlego...completa as frases com gestos.

Não se queixa da vida que teve, foi óptima aliás: teve um grande amor, amigos, saúde... mas garante que a velhice não tem sido meiga desde que chegou, agora é apenas uma sombra do que já foi.

Para além das doenças pouco mais tem de seu...sobraram-lhe os afectos que nunca conseguiu deixar de espalhar e um xaile de renda que lhe ofereceu uma das enfermeiras do centro, no Natal passado.

"-E é isto querida...é isto que levamos desta vida..." resume a sorrir enquanto se levanta para ir comer a sopa antes que fique fria.

...
...

porra!!! é só isto que sobra???

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

matutar...

O problema de morar sozinho...
é que é sempre a nossa vez de lavar a louça

terça-feira, 11 de novembro de 2008

sábado, 1 de novembro de 2008

Fazes-me Falta

" 1:O pior aconteceu-me cedo, tive sorte. Deus procura primeiro os que sofrem antes do conhecimento específico da dor, talvez porque os outros sabem demasiado para poderem ser salvos.
Tu dizias que era o contrário: que Deus nasce da ignorância própria dos sofrimentos permaturos. Mas tu, meu aluno dilecto, cedo te deixaste povoar pelo excesso do saber. Deus não sabia nada do Universo quando o criou. Imagino que se sentiria só. Imagino que num momento impreciso essa solidão se terá tornado maior do que Ele próprio, estourando numa gigantesca flor de luz. E imagino-O, depois, tentando dar um sentido particular a cada uma das pétalas dessa luz dispersa."

" 8:A tua alegria era um vírus incurável. Chamava-te Sininho porque, como a fada de Peter Pan, refilavas muito e espalhavas pó de ouro em tudo o que tocavas. Em contrapartida eras temperamental e chorosa, hiper-sensível. E tinhas uma excessiva tendência para a vingança, que acabou por se me colar à pele. Mas até aquilo a que eu mais resistia em ti se tornou carne da minha carne. Adoptei-te amores e ódios. Era teu amigo. Nunca me cansei de ti; cansei-me apenas do teu cansaço de ti mesma."

Um livro de Inês Pedrosa

Uma história contada a duas vozes ... onde ele e ela falam do irreparável e de sentimentos imortais